quarta-feira, 30 de julho de 2014

Crítica: Watch_Dogs

Disponível para: PC, PS3, PS4, XBONE e X360 (Testada).



Dizer que Watch_Dogs não correspondeu as suas expectativas é constatar o óbvio já que, apesar de ser humanamente impossível fazer um jogo que seja jus ao seu pesadíssimo marketing, mostra que, caso faça sucesso comercial até o fim do ano do lançamento, este se dará mais pela falta de inovação do que pela presença dela. O mero uso do “hack como uma arma” aqui está mais para uma solução de um desafio de fazer um Assassin's Creed situado nos dias de hoje sem fazer com que se pareça com Hitman do que algo realmente inovador. E, sim: o “detector de perfis” aqui é, basicamente, o “olhos de águia” do Assassin's Creed.

O grande mimimi dos “gamers” se resume ao jogo não fornecer os gráficos que os comerciais prometeram, ignorando a existência de marketing, algo que existe em todos os setores desse mundo capitalista. Considerando que a primeiríssima cena do jogo era um flashbach pessimamente enfocado e com extrema poluição visual, isso pode ser encarado como um “dê atenção para o meu conteúdo do que para minha aparência”, ou, para algum jogador impaciente, “sou uma porcaria, mesmo”.

Estranho saber que, apesar de o game abordar temas como hackers, informática e tecnologia, o game não tem noção de como hackeamento e energia elétrica realmente funcionam, mas não vou levar isso muito a sério, já que estamos falando de uma história ficcional. Os “hacks” que o game te permite fazer soam mais como algum superpoder do seriado Heroes (citar esse seriado quase nunca é bom sinal) e o smartphone soa mais como uma “varinha mágica” dos poderes de seu protagonista.

Falando do protagonista, Aiden Pearce não é um personagem muito carismático. Ubisoft deve achar que colocar um boné e uma voz de Batman do Christian Bale torna qualquer personagem carismático esquecendo que grande parte da falta de carisma do personagem se resume na sua grande semelhança com vários protagonistas de outros games: homem branco de 30-40 anos heterossexual com barba feita e cabelo curto com transtornos de agressividade e falta de grandes demonstrações de empatia ou de qualquer outra emoção.

Aiden era um mercenário/hacker que, ao abortar uma missão que tinha grande chance de fracassar, recebe uma retaliação em forma de assassinato de sua sobrinha em um acidente de carro provocada por um outro mercenário. Essa “história de origem” soa estúpido porque, além de “vingar um parente morto” ser um dos clichês mais utilizados da história dos videogames, a história apresenta o nosso “Super Tio” como uma “figura muito distante da família” e de que a própria mãe da garota, que viveu todo dia com ela, já conseguiu superar esse trauma após um ano, o que prova a minha tese de que muitos dos protagonistas de games de hoje precisariam ir a um psiquiatra se tratar, e não apenas a Lara Croft.

A história é muito confusa porque, na verdade, são três histórias diferentes sendo contadas simultaneamente: Aiden contrata um mercenário para capturar o assassino de sua sobrinha e torturá-lo para conseguir informações sobre o mandante do crime (esse é o nosso justiceiro, pessoal!), enquanto um ex-colega de trabalho sequestra a sua irmã (videogames parecem sempre precisar “sequestrar uma mulher”) para obrigar Aiden a roubar informações localizadas em um quartel-general de uma gangue de traficantes local, enquanto ajuda BadBoy17 (atual colega de trabalho) a achar um bunker perdido que, supostamente, seria impenetrável a invasão de hackers. Ver a reação de Aiden ao descobrir quem é BadBoy17 de verdade demonstra claramente que a ausência de personagens femininos em Assassins Creed Unity não foi um machismo acidental por parte da Ubisoft.

(A afirmação acima não é considerado um spoiler, já que acontece bem no início do jogo)

Se você acha difícil acompanhar essa história, imagina se você decidir pausar um pouco dessa história para aproveitar os mini-games que esse sandbox tem a oferecer. O pior é que as atividades que esse jogo tem a oferecer são infinitamente mais interessantes e divertidas do que a própria história do jogo.

Considerando que Aiden se movimenta demais para um hacker (visto que ele tem fôlego ilimitado e fator de cura; elementos que, infelizmente, são mandatórias em jogos de hoje), é natural que você tenha que dar alguma prioridade para os veículos. E esse jogo tem, na jogabilidade dos veículos, a sua principal virtude. É sério: Watch_Dogs é um melhor reboot de Need for Speed: Most Wanted que o próprio reboot de Most Wanted, apesar de sua jogabilidade se assemelhar mais com o Carbon, outro jogo da franquia Need for Speed.

Cada veículo se comporta de maneira diferente e pode ser facilmente verificado o seu estilo baseando no seu formato e em sua pintura. As opções de músicas no jogo ao serem tocadas no rádio dos veículos são vastas, de todos os gostos e de boa qualidade, dando para aproveitar a viagem. Os modos de mini-jogo com os veículos variam de Contrato de Mercenário (ir de ponto A a ponto B) até a Escolta de Criminosos (matar ou nocautear um criminoso escoltado), que funcionam de maneira minimamente satisfatória, porém repetitivo e tedioso se você for fã de franquias de corrida.

Os quebra-cabeças de “hacks” são muito bem montados até o momento onde o mapa do quebra-cabeça se torna tridimensional e/ou complexo demais, a ponto de transformar as peças pequenas demais para uma visão clara.

Se tem um mini-game que é extremamente falho está na intervenção de um crime (que aqui é apenas o assassinato). Existem vários motivos para essa falha, mas a principal se reside em o jogo só te premiar quando você intervir no assassinato em um momento exato (e mesmo assim, a possível vítima foge de medo do justiceiro que acabou de salvar sua vida sem agradecimento algum). Entrar tarde demais não evitaria o assassinato e entrar antes o jogo fala que a missão foi um fracasso, apesar de o jogo demonstrar claramente que o possível assassino e vítima saem da cena juntinho, quase de mãos dadas. E nem foi preciso citar os dilemas de “pré-crime” de Minority Report para demonstrar uma aplicação falha no jogo.

Obviamente Watch_Dogs tem vários outros mini-games, mas estes estão aí mais para forçar o jogador a comprar em definitivo o jogo e evitar com que o jogador venda o seu jogo ou alugue para jogar por um tempinho. Sério, quem vai comprar Watch_Dogs para jogar xadrez ou pôker?

Outra coisa que Watch_Dogs consegue mandar muito bem é em algo que os sandbox em geral não conseguem lidar bem: os level-designs. Sim, as fases dos automóveis costumam ter uma pequena poluição visual com os botões de detonação ocupando boa parte da tela e a divisão dos atos serem completamente desbalanceadas com um ato tendo cinco fases e outra tendo quinze (mais por falhas de enredo do que de roteiro); mas a grande maioria das fases são bem montadas porque cada objeto que foi colocado dentro da fase tem um motivo específico para estar lá e aproveitar o que o ambiente te oferece é o caminho para jogar Watch_Dogs.

Apesar de ter um tutorial minimamente decente e que permite uma fácil absorção da informação, é muito deprimente saber que a primeiríssima coisa que o jogo te exige é saber atirar, antes mesmo de saber se movimentar ou até usar a câmera para olhar o ambiente. A progressão de habilidades do personagem tem vários elementos desnecessários, como hackear mais dinheiro (dinheiro nunca falta no jogo), proteção contra pneu furado (pneus quase nunca furam no jogo) e hack de helicóptero (quase nunca estão em campo de visão para fazer).

A dicotomia “boa jogabilidade e péssima história” persiste até o final, com vários “plot-twists” extremamente previsíveis (a ponto de fazer o M. Night Shayamalan ter inveja) e com fases com desafios muito interessantes que testam ao máximo as habilidades aprendidas no jogo pelo jogador, ignorando a falsa ideia em que vários jogos têm (inclusive esse mesmo em uma parte) em achar que um Chefão é um mero “capanga que tomou muito Whey Protein”.

Apesar de a história ter um desfecho satisfatório (apesar de ter vários “plot holes”), o jogo usou um conceito que não foi explorado ao máximo. Algumas ideias que faltaram se resumem em, por exemplo, hackear os carros para poder analisar seus atributos, colocar explosivos nos carros, derrubar placas de publicidade nos policiais, hackear para comandar remotamente carros e helicópteros, se apoiar em precipícios, usar bombas de fumaça, hackear alto-falantes,  defesa de luta corpo a corpo, carregar os cadáveres e utilizá-los como distração ou como cadáver-bomba, dentre vários outros.

Se tem algo pior que a história é o seu título. Para um jogo de hackers, faria sentido se tivesse mais números, como por exemplo W@7C:#_D0GZ ou G3RAÇ40 BR45IL. Considerando que os “cães de guarda” do título (os hacktivistas DedSec) só aparecem no final do jogo e desaparecem na primeira recusa do protagonista, Watch_Dogs não é um nome apropriado para o jogo. Que tal “Homem Branco Ranzinza Matando Geral”? Ah, não dá. Praticamente todo jogo blockbuster é assim.

segunda-feira, 28 de julho de 2014

Reformulando o Teste de Bechdel



Para quem não sabe, o Teste de Bechdel foi primeiramente introduzido em uma tirinha da cartunista Alison Bechdel onde a personagem da história só assistiria a um filme nos cinemas se esse passasse por três requisitos:

1- Ter, pelo menos, duas mulheres
2- Que conversem entre si
3- Sobre um assunto que não seja um homem

Esse teste caiu no gosto da Internet, já que Nerds adoram transformar coisas abstratas em números e equações, e várias feministas também são Nerds (basta ver minhas leitoras). E, desde então, pessoas vêm utilizando esse teste para medir o grau de feminismo de um filme. Inclusive, a Suécia anunciou oficialmente de que iria criar uma "nota de feminismo" em cada filme lançado lá baseado no teste.

Só que tem um pequeno problema: o teste de Bechdel não serve para medir o grau de feminismo de um filme. Na verdade, sequer chega perto de funcionar. Temos vários filmes pornôs, "sexploitation" ou filmes com valores machistas que passam no teste de Bechdel (ex: Crespúsculo, Transformers, Sex and the City, provável filme do 50 tons de cinza e qualquer filme baseado nos livros de Nicholas Sparks) enquanto outros em que temos personagens femininas fortes e independentes no filme e não passam no teste (ex: Sarah Connor de Exterminador do Futuro, Hermione de Harry Potter [estou me referindo ao último filme], a cientista de Avatar [do James Cameron, não o anime], a nerd de Tá Chovendo Hamburger e qualquer filme da história feito sobre Joana D'arc).

O exemplo mais evidente talvez seja a de "Corra, Lola, Corra", cuja personagem era tão bem representada que serviu de inspiração para a criação do "Escreva, Lola, Escreva" o blog feminista mais famoso do Brasil, definitivamente NÃO passar no teste de Bechdel.

Vários dos filmes em que figuram na lista de melhores filmes de todos os tempos por vários cinéfilos não passam nesse teste: Cidadão Kane, 2001, os Caça-fantasmas, De volta pro futuro, Ben Hur, Star Wars, Senhor dos Anéis e entre vários outros. Alguns desses, como O Poderoso Chefão e O Lobo de Wall Street são bons exatamente por não passarem no teste: são machistas porque mostram um ambiente machista.

Esse teste ficou tão famoso ao ponto de alguns filmes criarem una cena específica sem contexto narrativo apenas com o objetivo de passar no teste. Homem de Ferro 3 talvez seja o mais clássico exemplo disso.

Esse teste nunca serviu para medir o feminismo de um filme individual, mas para avaliar o machismo dentro da indústria do cinema. O importante não é saber se filme X ou Y passa, mas a grande quantidade de filmes não passarem no teste demonstra uma incapacidade de Hollywood de considerar mulher como um ser humano íntegro.

Então, como avaliar o grau de feminismo de um filme?

Eu vou apresentar aqui uma variável do teste de Bechdel em que vários críticos de cinemas estão começando a utilizar. O método foi chamado de Teste de Mako Mori, em alusão a protagonista de "Círculo de Fogo", mais um filme em que tem uma personagem feminina forte e independente e que não passa no teste. Esse teste funcionaria da seguinte maneira:

1- O filme precisa ter, pelo menos, uma mulher
2- Que tenha um arco narrativo próprio
3- E que esse arco não dependa de um homem

Olhando para esses critérios, dá para notar que esse teste geralmente tem um outro nome: CRIAR UMA PERSONAGEM DECENTE. Também não serve para graduar o feminismo de um filme, mas sim para avaliar se uma personagem foi  bem desenvolvida, independente do gênero, etnia ou sexualidade.

Considerando que Feminismo é um movimento filosófico, social e político, posso concluir que não existe uma maneira eficiente de avaliar matematicamente o grau de feminismo de um filme porque idéias são a prova de balas não são uma ciência exata.



P.S.: Meu blog teve pouca atividade nessas últimas duas semanas porque eu estava ocupado fazendo o meu próximo post, que eu tinha prometido fazer há MUITO tempo. Uma dica: cães de guarda! :P

quarta-feira, 2 de julho de 2014

Não use a palavra "Gamer"!

Por que "Nerd Erudito"?

Basicamente porque é um nome fácil de se achar no Google, ninguém estava usando e que incorpora muito bem com a ideia do blog: "sobrepensar" assuntos da cultura nerd (idiotas chamam isso de "procurar pelo em ovo"). Ao contrário do que pensam, eu não sou um "guru" que contém todo o conhecimento da humanidade. Eu sou humilde em relação a isso e gosto de conhecer mais sobre determinados assuntos.

Os dois maiores problemas que eu tenho que enfrentar com a nomenclatura do blog é com a impressão de que eu seria esnobe e arrogante (que eu não sou) e a de que eu tenho que provar o nome de "Erudito" do blog toda hora tendo que procurar (e pensar) sobre coisas bem inteligentes para escrever. Aquelas em que já não foram escritas por outros blogueiros bem mais famosos que eu, é claro.

Então porque eu, que falo muito de videogames, não usei o termo "Gamer" no blog? Se os amantes de cinema gostam de se chamar de "cinéfilos", porque os amantes de games não poderiam se chamar de "gamers"? O motivo é de que eu odeio a palavra gamer e vocês também deveriam odiar.

Na época onde os primeiros fãs de videogames surgiram, "gamer" tinha o mesmo estereótipo do "Nerd" na cultura popular: eram os introvertidos feios desajeitados com óculos "fundo-de-garrafa" sem estatura física para esportes e que tinha grande afinidade com assuntos que outras pessoas tinham aversão, como por exemplo tecnologia.

Hoje em dia, o estereótipo de "gamer" é aquele homem machista, racista e homofóbico da faixa dos trinta anos de idade que tem sérios transtornos de agressividade, que troca insultos gratuitos na internet com qualquer um que não seja homem branco heterossexual ou que discorde politicamente dele. A única semelhança entre os dois estereótipos está na dificuldade de socialização.

A julgar pelos dois estereótipos, dá para notar uma evidente involução. Hoje em dia se você falar na rua para um estranho, independente do gênero ou etnia, que você é um gamer, eles vão achar que você é uma pessoa que vive com raiva e que gosta de trocar xingamento com outras pessoas. Esse estereótipo negativo está tão sério que a Nintendo, a maior desenvolvedora de games do planeta, faz comercial de seus produtos dizendo que elas não são "gamers" por jogarem os jogos dela.

Ah, você diria, antigamente estranhos também olharam atravessado para os gamers, não é? 

Mais ou menos, porque antigamente a negação das pessoas em relação com gamers era de desprezo; hoje é de medo. Eu nem estou me referindo a besteira de "games causam violência", que nem merece ser discutido. A questão é que essas pessoas que já tem um discurso de ódio começaram a ver os games como um ambiente habitável e começaram a ficar por lá. Não é a toa que os fóruns de games são os que costumam ter o maior nível de machismo, racismo e homofobia da internet.

Essa estupidez de os "gamers" acolherem skinheads e neonazistas tem como origem o complexo de vítima. "Gamers" sempre vêem que QUALQUER acusação ou proposta de debate é uma tentativa de banir os games que eles sempre amam simplesmente porque já viveram uma situação de tentativa de banimento (por suposta violência). Aí virou prato cheio para os ultra-conservadores para usar essa desculpa como escudo.

Uma mensagem para vocês: ninguém está propondo banimento de game algum quando fala que algo é machista ou racista. O que esta pessoa está fazendo(ou querendo fazer) é apontar uma falha de tal jogo para que se possa MELHORAR o jogo ou até fazer com que a experiência filosófica de debater o jogo fique mais imersiva,ou seja, levando videogames a sério.

Vocês sempre terão as suas princesas indefesas precisando de resgate de um herói viril, sempre terão as suas gostosas tetudas para bater punheta enquanto jogam e ninguém, pelo que eu saiba, está propondo que só tenha mulher "feia" nos jogos. O que essas pessoas estão pedindo é uma maior variedade e diversidade. E isso é exatamente o contrário de estagnar com a indústria de games.

Então, queridos "gamers": expulsem esses skinheads e neonazistas de seus fórums por completo e falem pra sociedade que vocês não são pessoas com sérios transtornos de agressividade e que vocês, sim, aceitam muito bem a entrada de novas pessoas e de belos debates. Enquanto isso, eu vou evitar a palavra "gamer" e eu quero que vocês façam o mesmo.

Como é mesmo o termo que o pessoal usa pra quem joga?

Ok então: Eu sou um Jogador!