quinta-feira, 29 de maio de 2014

Sucker Punch é sobre feminismo



Eu já tinha prometido em fazer esse post faz um mês. Ah, e tem SPOILERS em todo o texto (o filme foi lançado três anos atrás).

Sucker Punch foi um filme quase universalmente odiado pelo público, críticos e especialmente pelas feministas (por “objetificar” as protagonistas) e deu ao seu diretor, Zack Snyder, uma má fama de ter “problemas com mulheres”, considerando que ele já dirigiu 300 (um ode ao masculinismo) e Homem de Aço (que tinha uma misândrica como vilã).

E eu vou escrever agora que Sucker Punch é, não apenas feminista, como também é sobre feminismo. E eu não vou usar o argumento do “essas mulheres são fortes portanto são feministas”. Como assim? Vou começar pelo título:

Sucker Punch é uma gíria da língua inglesa que significa “um golpe sofrido que não foi antecipado nem visto”. “Soco surpresa”, para uma tradução mais literal.

Faria muito mais sentido o filme ser chamado de misândrico do que misógino, já que todos os personagens masculinos da história são nojentos, asquerosos, monstruosos e estupradores.

Dito isso, é um filme em que as mulheres tentam escapar de uma instituição psiquiárica presidida por esses monstros fazendo striptease neles. E, toda hora que elas fazem striptease, o filme corta para uma cena de ação super-estilizada com muitos efeitos visuais e com as protagonistas de roupas bem curtas.

Essas cenas de ação foram feitas para que o público-alvo nerds (leia-se homens brancos cis e heterossexuais) se deliciarem com as garotas da mesma maneira em que aqueles homens asquerosos deliciam a striptease das garotas. E é por isso que o filme se chama SUCKER PUNCH. O diretor está chamando o público de “nojento” por associá-los a aqueles homens asquerosos do filme; um golpe que o público nem percebeu de onde veio.

Ok, vamos falar mais detalhadamente sobre o filme:

O filme enfoca na personagem Babydoll. Ela tem uma aparência infantilóide, mas ela é a mais hiperativa, mais objetiva e mais enfocada em seus objetivos, nem tendo vergonha de partir pra cima de seus adversários usando o seu próprio corpo como uma arma. Ela é uma metáfora da terceira onda do feminismo.

Para deixar mais claro: as feministas dessa onda costumam protestar contra a hipersensualização do corpo feminino fazendo topless em público. Esse ato é feito para demonstrar como é normal os homens mostrarem mamilos na rua, enquanto com as mulheres não é normal. A atenção feita pela mídia por causa dos mamilos é uma consequência e também uma tentativa de atrair o público para a causa.

Voltando ao filme: Babydoll foi encaminhada para uma instituição psiquiátrica onde os responsáveis de lá planejam lobotomizar e estuprar as garotas do local. Lá, ela encontra três garotas para ajudar ela a escapar do local. Duas delas eram Blondie e Rocket: elas detestam estar lá e já tentaram escapar sem sucesso e tentam ajudar Babydoll. Elas são a primeira e a segunda onda do feminismo.

A outra (Sweet Pea) não está confiante no plano dela. Ela sempre viveu naquele lugar e, apesar de querer sair, ela não acredita que seja possível exatamente porque já viu tentativas fracassadas. Ela é a metáfora da quarta onda do feminismo. Percebam como que a roupa de Sweet Pea é muito menos reveladora do que as outras. Isso porque, apesar de não ver isso como um artifício útil, ela tem medo de chamar a atenção desses homens macabros.

Vocês vão reconhecer esse tipo de feminista: são aquelas que acham que todo o tipo de sexualidade é um “male gaze”, que toda mulher sexy (seja real ou ficcional) foi feita para saciar o homem e que realmente acreditam na idéia de “se vestir melhor para previnir estupros”. Também são aquelas que tem medo de se mobilizar politicamente ou falar em público sobre feminismo ora porque “política é uma merda” ou porque “não quero que as pessoas me achem que sou feia e mal-amada”.

Com muita hesitação, ela aceita em se juntar com as três para tentar escapar do lugar. Em toda cena de ação (ou striptease), elas encontram com um Sábio, que orienta as garotas a como prosseguir e fala como fazer para dar certo. Ele é o único homem que não é mostrado como nojento e asqueroso. O Sábio conhece a estrutura local, tem experiência, e tem total capacidade de lidar com toda a situação sozinho, mas está ciente que a luta não é dele e ele não pode, por obrigação moral, liderar elas. Ele é a metáfora do homem feminista.

Na última cena de ação (striptease) do filme, sobrando apenas a Babydoll e Sweet Pea, percebemos que o plano só dará certo se Babydoll sacrificar a sua vida para Sweet Pea escapar. Ou seja: a terceira onda não é aquela que derrubará o patriarcado, mas a sua luta vai influenciar e inspirar a quarta onda a realmente conseguir tal feito.

Se ao menos o filme fosse mais explícito com isso, seria certamente um baita filme. Mais ainda do que realmente é.



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4 comentários:

  1. Finalmente alguém que pensa que Sucker Punch é sobre feminismo! Pensei que eu fosse a única. Embora eu não tenha pensado nessa perspectiva (sobre as diferentes ondas do feminismo), pra mim sempre fez muito sentido dizer que Sucker Punch é feminista, porque é uma metáfora sobre como o patriarcado explora as mulheres de diferentes maneiras, desde o padrasto que tem mais poder que Babydoll simplesmente por ser homem, o que faz com que ninguém questione a decisão dele de internar Babydoll e que a palavra dele tenha muito mais valor que a dela, até a exploração sexual na "clínica psiquiátrica". E embora eu não seja tão inocente a ponto de não saber que as roupas curtas foram feitas para agradar ao público masculino cissexual branco e hétero, eu acho que elas fazem todo o sentido dentro do contexto da história. Gosto também do fato do filme mostrar relações de parceria entre mulheres, e não de competição.

    O único ponto em que discordei do seu texto foi a parte sobre o sábio. Embora ele realmente possa ser interpretado como uma metáfora para o homem feminista, eu fiquei meio incomodada com o fato de ele guiar as garotas, e de elas só conseguirem escapar com a ajuda dele, como se as mulheres não fossem capazes de escapar sem a orientação de um homem. Mas no geral, gosto muito do filme. E adoro as lutas também :)

    Adorei seu blog!

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    1. Obrigado! :)

      As "roupas curtas para agradar o público masculino" nesse filme é uma paródia aos filmes e animes que usam desse recurso para o "male gaze". É... o sábio guia e orienta, mas pelo menos ele não luta sozinho ou entra na luta. Afinal de contas, a luta é delas.

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  2. A visão que eu tinha do feminismo de Sucker Punch é totalmente diferente [ou não~], até pq eu nunca imaginaria essas ondas feministas relacionadas em cada uma das personagens. Eu já tinha percebido que indiretamente, ao colocar as meninas vestindo micro-roupas, o diretor estava chamando a audiência de nojenta. Por favor, Baby Doll parece qualquer vizinha pequenininha que morre de preguiça de ir pra escola e a Vanessa Hudges tinha acabado de sair de High School Musical. A imagem inocente dela tava bem forte nessa época!

    Eu sempre vi a sensualidade das meninas como uma forma de usar o patriarcado (novinhas em roupas curtas) como armas delas contra aqueles que as oprimiam. Meio que um "jogamos com as cartas que nos foram dadas".

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